

A HISTÓRIA DO JUDÔ
O judô originou-se no Japão no ano de 1882, criado pelo japonês Jigoro Kano. A criação dessa nova arte marcial relaciona-se diretamente com a história de vida de seu fundador. Kano reuniu a essência do jujútsu – arte marcial praticada pelos bushis (ou cavaleiros) durante o período Kamakura (1185-1333), com outras lutas praticadas no Oriente e as fundiu numa única arte marcial: o judô.
O cenário histórico no qual surgiu o judô foi marcado por uma época em que, no Japão, praticavam-se diversas artes marciais com as mãos vazias. Pois, a mudança de Imperador em 1868, que marcou o fim da Era Edo e o início da restauração Meiji, gerou mudanças profundas nos costumes da sociedade japonesa, inclusive nas artes marciais praticadas na época.
O jujutsu estava entre elas, o qual também foi chamado de Taijutsu e de yawara. O jujutsu era um sistema de ataque em que se podia arremessar o oponente, bater nele, apunhalar, chutar, chicotear, estrangular, torcer e/ou entortar seus membros e imobilizar. Todavia, esse sistema também ensinava a defesa para tais ataques. Essa arte era conhecida e praticada há muito tempo, mas somente após o século XVI, passou a ser ensinada e praticada de forma sistematizada. Porém, ainda faltava orientação didática e obediência a qualquer princípio no ensinamento dessa técnica.
Assim, o jujutso foi o ponto de partida para Jigoro Kano criar o judô. No entanto, como esse surgimento está totalmente atrelado à história de vida de seu criador, é praticamente impossível relatá-lo sem contar como foi a trajetória de Kano.

Jigoro Kano nasceu no dia 28 de outubro de 1860 na cidade Mikage, distrito de Hyogo, sendo o terceiro filho de uma família nobre japonesa com uma riqueza advinda da fabricação e comércio do saque (vinho de arroz japonês). Era um jovem baixo e franzino (com aproximadamente 1,50 metros de altura e pesando apenas 50 quilos). Mas, isso não o impediu de que praticasse e buscasse o conhecimento sobre as artes marciais, pelo contrário, foi o que impulsionou seu interesse, pois "compensava seu pequeno porte com tenacidade, coragem e, sobretudo, grande inteligência" (Virgílio, 1986).
Aos 16 anos decidiu fortificar o corpo, praticando ginástica, remo e basebol. Porém, por ser brutalizado pelos colegas de classe, e sendo filho de um Samurai, decidiu praticar e estudar o jiu-jitsu com o intuito de se defender. (FREITAS; VIEIRA, 2006).
Iniciou o treinamento de Jiu-Jitsu aos dezessete anos com o professor Teinosuke Yagi. Em seguida, no ano de 1877 ingressou na Universidade Imperial de Tokio e tornou-se aluno do Mestre Hachinosuke Fukuda da Escola Coração do Salgueiro. Porém, após dois anos de treinamentos, em 1879, o mestre Fukuda faleceu (aos 82 anos de idade) e Kano herdou seus arquivos. Consecutivamente tornou-se aluno do mestre Masatomo Iso, um sexagenário que possuía os segredos de uma escola derivando, assim como o mestre Fukuda, do Tenjin-Shinyo-ryu.
Dando continuidade ao seu treinamento, Jigoro Kano então se torna vice-presidente da escola onde treinara, mas, infelizmente, Masatomo Iso faleceu muito cedo e Kano novamente encontrou-se sem professor. Contudo, Kano continuou a treinar intensamente, mas um bom professor lhe era indispensável, e foi então que procurou o mestre Tsunetoshi Iikubo que lhe ensinou a técnica da escola Kito-Ryu. Como Kano até então só havia praticado as lutas corpo a corpo, sempre usando roupas normais, a escola de Kito ensinou-lhe o combate com armadura. Assim, Kano treinou com o mestre Iikubo até o ano de 1885.
A convivência com vários mestres famosos e a sua dedicação aos estudos e pesquisas constantes, foram muito valiosas para Jigoro Kano. Ele percebeu que cada professor apresentava sua arte como um conjunto de técnicas próprio, sem que houvesse um princípio que norteasse o ensinamento dessa arte.
Após muito estudo sobre esse assunto, Jigoro Kano percebeu o único principio que unia tudo: era necessário fazer o uso mais eficiente possível das energias mental e física. Assim, a partir desta descoberta, ele estudou novamente todos os métodos de ataque e defesa que tinha aprendido, mantendo apenas as técnicas que estivessem de acordo com esse princípio. Ao final, reuniu um conjunto de todas as técnicas resultantes e chamou, então, de judô (KANO, 2008).
A palavra Judô é escrita com dois ideogramas chineses, o ju significa “suavidade” ou “gentilmente” e o do, “princípio” ou “caminho”. Podemos traduzir o judô como “caminho suave” ou “caminho da gentileza”, sendo necessário ceder, para finalmente obter a vitória. Ou seja, a ideia de Kano era desenvolver um treinamento para que as pessoas aprendessem a resolver seus conflitos de maneira harmônica e suave.
Então, Jigoro Kano elaborou uma a síntese das melhores técnicas, escolheu os golpes mais eficazes e os mais racionais; eliminando as práticas perigosas e incompatíveis com o fim elevado que visava. Também aperfeiçoou a maneira de cair, inventou o principio das quedas de amortecimento e ainda criou uma vestimenta especial para treino (judogui), pois o antigo traje dos ju-jitsukas provocava frequentemente ferimentos. Além de dedicar-se especialmente aos métodos de projeção, aperfeiçoando vários de sua autoria.
Em fevereiro do ano de 1882, com apenas 21 anos de idade, Jigoro Kano fundou o Instituto Kodokan para ensinar judô a outras pessoas. O significado de Kodocan é “escola para o estudo do caminho”. A Kodokan estava localizada no segundo andar de um templo budista Eishoji de Kita Inaritcho, bairro de Shimoya em Tóquio, onde havia apenas doze jos (jo medida de superfície, módulo de tatame). Em pouco tempo o número de alunos do Kodokan cresceu rapidamente. Advindos de diversas partes do Japão, muitos alunos abandonaram seus mestres de jujutsu para treinar com Kano. Desta forma, a escola progrediu e logo se tornou célebre.
Após criar a Kodokan, Jigoro Kano segue sua vida profissional dedicando-se ao esporte e à educação. Kano foi um cidadão ímpar no Império japonês, acumulando diversas funções e Honrarias, sendo "Professor Universitário, vice-presidente e reitor do Colégio de Nobres, adido do ministro da Casa Imperial, conselheiro do Ministro da Educação Nacional, diretor da Escola Normal Superior e ainda secretário da Educação Nacional, galgou os degraus da Escala Imperial Japonesa, chegando ao segundo grau após sua morte" (Virgílio, 1986). Em 1922, passou a dedicar-se exclusivamente ao Judô, sendo professor Honorário da Escola Normal Superior de Tókio e Conselheiro do Gabinete Japonês de Educação Física. Seu nome foi perpetuado como educador e esportista que foi, sendo considerado o "Pai da Educação Física do Japão" (Virgílio, 1986).
No ano de 1928, Kano participa da assembleia geral dos Jogos Olímpicos, inclusive, dos próprios jogos. Assim, em 1932 desloca-se aos Estados Unidos para assistir aos Jogos Olímpicos, e posteriormente, torna-se conselheiro do Gabinete de Educação Física do Japão; além de continuar a participar por mais duas vezes no Conselho dos Jogos Olímpicos, no qual lançou o convite para os jogos japoneses (1932 – 1934). Entretanto, no dia 4 de maio de 1938, Jigoro Kano morre a bordo do navio que o transportava ao Cairo onde seria realizada a assembleia geral do Comitê Internacional dos Jogos Olímpicos.
O sonho de Jigoro Kano era poder ver o judô nos Jogos Olímpicos, e isso só se torna possível no ano de 1964 em Tókio, porém, sendo apenas como demonstração. E só retorna como modalidade oficial dos Jogos em 1972 na cidade de Munique. Assim, o judô assume definitivamente seu papel de desporto olímpico, com representantes de praticamente todos os países do mundo. Atualmente vários países são filiados à Federação Internacional de Judô.
Para Jigoro Kano praticar judô é mais que aprender com eficiência suas técnicas, mas sim, ajudar no desenvolvimento pessoal do indivíduo, ajudando-o a controlar seus impulsos e emoções, a ser disciplinado e perseverante, formando um cidadão virtuoso. A essência dessa filosofia é a base do judô cultivada ainda hoje em todo o mundo. Responsável pela expansão do judô, Kano se transformou no mais famoso mestre japonês de artes marciais (FREITAS; VIEIRA,2006).
O judô no Brasil
Calleja (1979) relata a importância da imigração japonesa para introdução do Judô no Brasil, e diz "tal fato ocorreu de forma desordenada e sem nenhum planejamento. Lamentavelmente, não houve uma missão oficial, com o intuito de divulgar, segundo os princípios da Kodokan". Esse relato demonstra a dificuldade de determinar as formas de introdução e/ou divulgação do início do Judô para o país. O apoio para esta ideia advém do professor Massao Shinorrara (9º Dan) em Virgílio (1996), que afirma que o judô foi implantado no Brasil por volta do ano 1908, com o advento da "imigração japonesa, cujo primeiro contingente chegou ao porto de Santos em 18 de junho de 1908, a bordo do navio Kasato Maru, com referências ao Judô, entretanto não há registros de nomes, datas e locais". Coloca-se, portanto, que o Judô nesta primeira instância veio para o país de forma agregada à cultura dos imigrantes japoneses.
O personagem que mais possui crédito para ser considerado o precursor do judô no Brasil é o Mitsuyo Maeda, ou como alguns autores citam Eisei Maeda, também conhecido como Conde Koma. Apesar de ter aparecido anos após a entrada dos primeiros imigrantes japoneses, ele veio como enviado especial da Kodokan para divulgar o Judô por meio de demonstração e em combates de desafios ("Vale Tudo").
Conde Koma fez sua primeira apresentação de judô no Brasil na cidade de Porto Alegre, passando pelos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Em seguida, em outubro de 1915, foi para a cidade de Belém do Pará-PA onde criou uma escola e popularizou seus conhecimentos dessa arte. Contudo, Conde Koma faleceu nesta cidade em 1941, e dos vários alunos que frequentaram sua academia, restou apenas a família Gracie para dar continuidade ao seu trabalho. Outros mestres também realizavam exibições e aceitavam desafios em locais públicos, mas, ainda sim, foi um início difícil para um esporte que viria a se tornar tão difundido (VIRGÍLIO, 1986).
Um fator decisivo na história do judô foi à chegada de um grupo de nipônicos ao país em 1938. Tinham como líder o professor Riuzo Ogawa e fundaram a Academia Ogawa, com o objetivo de aprimorar a cultura física, moral e espiritual, por meio do esporte do quimono. Apesar de Riuzo Ogawa ser um mestre de jujutsu tradicional, chamou de Judô a arte marcial que lecionava depois que este nome se popularizou. Contudo, ensinava um estilo de luta que não era exatamente o Judô Kodokan, mas isso não diminui sua enorme contribuição ao começo do Judô no Brasil.
A partir daí, a cultura e os ensinamentos do mestre Jigoro Kano disseminou-se pelo país de tal forma, que em 18 de março de 1969 foi fundada a Confederação Brasileira de Judô, sendo reconhecida por decreto em 1972.
Atualmente o judô é ensinado em diversas academias e clubes, além de ser reconhecido como um esporte saudável que não está relacionado à violência. Esse processo culminou com a grande oferta de bons lutadores brasileiros atualmente, tendo conseguido diversos títulos internacionais e reconhecimento nacional.
O judô chegou ao estado do Paraná através dos imigrantes japoneses que vieram do interior do estado de São Paulo para o interior do estado do Paraná. A cidade berço do judô no estado foi Assai, na qual, no ano de 1937, foi fundada uma filial da entidade Brasil Ju-Kenmei, porém, no ano de 1939, esta entidade teve suas atividades paralisadas por conta da segunda guerra mundial. E somente em 1952 que o judô volta a ser praticado de forma sólida através da Academia de Judô de Assaí.
O primeiro campeonato paranaense de judô ocorreu em 1955. E no ano de 1961 foi criada a federação paranaense de judô, a qual era formada por três ligas: Liga Londrinense de Judô (cidade de Londrina); Associação Assaiense de Judô (município de Assaí) e Clube Esportivo Cultural Uraiense de Judô (cidade de Uraí).
O judô segue a máxima do ceder para vencer. A origem dessa máxima se deu quando o velho mestre Shirobei Akiama, estava observando um salgueiro e uma cerejeira durante o inverno e percebeu que os galhos da cerejeira quebravam sob o peso da neve, enquanto que o salgueiro, flexível, cedia, fazia a neve escorregar e não lhe dava chance de pressioná-lo e voltava ao seu estado original.
Assim, o judô se baseia em dois importantes princípios, que são: Seiryoku Zen’Yo – princípio da máxima eficácia do corpo e do espírito que diz respeito ao melhor uso da energia (física e mental) de forma que com o menor dispêndio de energia se consiga a máxima eficiência na ação; e o Jita Kyoei – princípio da prosperidade e benefícios mútuos, que diz respeito à importância da solidariedade humana para o melhor bem individual e universal.
Com base nos princípios e na metodologia de luta propostos por Jigoro Kano, vê-se quantos benefícios a prática sadia do Judô pode oferecer. O judô atualmente, além de ser uma modalidade de destaque no cenário esportivo, é também uma ferramenta importante na formação de um cidadão mais consciente e útil à sociedade.